segunda-feira, 26 de maio de 2014

Macumbia - Chuta Que É Macumbia [2014]


Macumbia é mais uma peça chave da nova cena que se configura em João Pessoa, da qual falei no post anterior. O próprio nome da banda já denuncia um lado mais obscuro do que uma simples banda de música dançante latino-americana: há uma inclinação forte para a estética do dub pedrada, aquela estética que prende a música no chão e prende o ouvinte à música, quer queira quer não. Há também um humor negro muito sutil: o grande hit dançante da banda é André (vídeo abaixo), uma balada improvável sobre uma gravidez adolescente indesejada e seu consequente aborto - o tema da música passa despercebido debaixo do tom alegre da melodia e das guitarrinhas estaladas quase à paraense. A banda é uma excelente intérprete do melhor que o Caribe e arredores já produziu musicalmente no último século: cumbia, guitarrada, dub, ragga e até uma leve insinuação de música de surfista dos anos 90. Muito fácil de se envolver com a música, muito difícil de se desvencilhar - nesse caso o único conselho que posso dar é o da própria banda: chuta!



Tracklist

01 - Baila Mi Cumbia
02 - Milonga
03 - André
04 - Baia de La Traición
05 - Maria Tereza
06 - Never Will Be Heard
07 - Cidadela
08 - My Disorder

Clique na capa do álbum pra baixar.

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Los Cabras Gigantes - Lado A [2014]



Los Cabras Gigantes aparece em João Pessoa no meio de uma efervescência. Uma confluência de astros, inconsciente coletivo, demanda de público? O fato é que na nossa pequena cidade existia o que alguns frequentadores dos antros mais escuros da noite pessoense chamam de "vácuo da sarrabulhagem". Explico: existia uma vontade muito grande no meio alternativo de rala-buxo, putaria dançante mesmo, uma fatia de mercado que estava historicamente monopolizada pelos esquemas semi-milionários do tão polêmico forró-de-plástico institucionalizado (seja lá qual for o significado dessa expressão hoje em dia), Aviões do Forró, Garota Safada e similares. Quem não compactua esteticamente, ideologicamente ou socialmente com essa galera, acabava recorrendo à discotecagem - já que felizmente temos uma boa leva de DJs aqui. Recife já preencheu o vácuo da sua sarrabulhagem muito bem e há muito tempo com uma leva de artistas que não ofendem o bom gosto, de Catarina Dee Jah à unanimidade de Academia da Berlinda. Agora o movimento começa - bandas novas e bandas que já estão na estrada há algum tempo estão fechando o cerco, e a única coisa que podemos fazer a respeito é usar camisinha. Em breve no blog que vos fala, postaremos mais e mais dessas bandas.

Los Cabras Gigantes talvez seja a mais nova dessa leva, uma big band improvável que parece destinada a compor o hit que vai parar o karoke da lagoa daqui a uns vinte anos. O perigo da banda é também sua qualidade: eles não têm limites. Música de putaria e coração partido pra qualquer estação, um frevinho pro carnaval, um forrozinho pro São João e uma música de corno pro dia dos namorados - é só escolher.






Tracklist:


01 - Swing da Philipéia
02 - Lugar Sem Direção
03 - La Cabrita Portunhola
04 - Ladeiras da Parahyba
05 - Dreher

Clique na capa do álbum pra baixar

terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Tudo de Som - Retrospectiva da Música Paraibana em 2013


Lucas Dourado, Haley Guimarães e Helinho Medeiros (foto de Rafael Passos)

Eu queria que a minha retrospectiva 2013 falasse de uma força transformadora. Isso porque 2013 foi um ano de transformações. E estas ocorrem em níveis múltiplos. E porque ocorrem, de maneira geral, através destes que consumo, achei por bem dividi-los. Elegi discos paraibanos lançados este ano aqui na Parahyba para contar destes 365 dias e seis horas. E poderia falar de muitos que aconteceram por aqui neste período, porque som não faltou, mas busquei uma concisão que me garantisse alguns leitores. Falarei, portanto, de três. Para além de serem da terrinha, eles têm um tanto mais em comum: representam uma nova fase no fazer musical de cá e oferecem não um punhado de canções, mas uma experiência sonora e literária - justamente o que busco oferecer enquanto autor e beber enquanto consumidor.




Tracklist:

01 - Coco de Jumenta
02 - Meninos
03 - Fumo do Parrá
04 - Casa da Pólvora
05 - Amassar a Lataria

E, já que é verão (finalmente!), eu começo com o ‘Amassar a Lataria’. O Sonora SambaGroove não é novidade nos palcos nossos (quem lembra do CINEPORT em 2011 ou do Festival de Areia de 2012?) e, ainda no primeiro semestre de dois mil e treze, brindou-nos com este EP que soa como cerveja gelada para os meus ouvidos. No ano passado essa turma pôs no mundo o EP ‘Gentileza’, o primeiro do que pode vir a ser uma série de produtos que se debruçam sobre a música autoral paraibana, batizado após a canção homônima de Arthur Pessoa. ‘Gentileza’ foi um brinde, responsável por trazer a tona a faceta compositora do vocalista da Cabruêra, dar-nos também a ‘Cigana’ nervosa do preciso e precioso baterista Nildo Gonzalez e ainda surpreender com uma inédita do veterano Adeildo Vieira. ‘Amassar a lataria’ não fica pra trás nesta empreitada de salvaguardar nosso vasto e denso repertório: Parrá vem brilhar na voz de Chico Limeira e Totonho não deixa ninguém indiferente na voz de Débora Malacar. O EP ainda vai mais longe e bebe nos discos do Tocaia da Paraíba e do Assaltarte – deste último saindo a minha faixa preferida, ‘Meninos’, com umas congas insuspeitadas do hábil Macaxeira Acioly. E por falar em congas, antes fosse este EP bem-sucedido apenas como resultado de uma pesquisa profundamente afetiva; é também um deleite sonoro. Onde tocar Fabiano Furmiga pode olhar pros lados que estarei. Daniel Vincent, também paraibano, é quem assina a capa de cores vivas e diretas. Apesar do hiato de alguns meses após o impecável show de lançamento do EP, a Sonora voltou com tudo na primeira edição de shows do MUSIC FROM PARAHYBA, coletânea organizada pela Divisão de Música da FUNESC visando festivais internacionais. Olhos e ouvidos abertos pra essa turma, que eles não brincam em serviço.




Tracklist:

01 - A Saga
02 - Tambaú
03 - O Santo da Grande Luz
04 - Barbante Prateado
05 - Motor Misterioso
06 - Temparada
07 - Idas e Vindas
08 - Saravá e Quengo
09 - O Cheiro e a Feira

Eu também não poderia ignorar as douradas engrenagens do ‘Motor Misterioso’. Em sua estreia, Lucas Dourado oferece aos ouvidos de quem escuta uma curiosa experiência lírica. Saltam aos meus olhos uma qualidade deliciosamente prosaica nas letras de cada canção e, ao mesmo tempo, rimas inusitadas e terrivelmente coerentes revelam no compositor um leitor e um re-leitor atentos. E coerente é também a articulação de um discurso que atravessa tudo que se diz nas canções. Os versos, assinados tanto pelo próprio Lucas quanto por Polly Barros, nos propõem uma perspectiva nitidamente inquieta do que nos povoa – côncavo/convexo, povo das estrelas, almas em barbantes, chão rachado, menino, feira, pé, bike e avião. Sua poesia, se não explode, está prestes a. Há também um belo poema de Renálide Carvalho, ‘Idas e Vindas’, de onde brotou em Lucas uma melodia inacreditavelmente natural. As harmonias encontram nos dedos de Helinho Medeiros e Haley Arthur uma parceria sólida; ora arrepiam, ora surpreendem. O disco, inclusive, conta com uma turma da pesada que fez nascer esse disco lá na Mutuca do Burro Morto, dos quais destaco Ruy José, Big Daniel, Uirá Garcia e Chico Limeira, pra não mencionar o violão do próprio Lucas. Mas o que me deixa sem sono mesmo no som desse baiano-muito-nosso é a melodia. Num papo que tivemos, ele, Toninho Borbo e eu, o Golden falou-nos de um raciocínio alinhado com o jazz que ele persegue na construção das frases melódicas, identificável sobretudo no ‘Barbante prateado’. Como que para ilustrar seu pensamento, cantou-nos a música toda a capela. Sim, porque Lucas é também um grande cantor, de voz clara como quem sabe o que quer. A capa é uma bela foto de Rafael Passos, a qual se soma a arte generosa de Sílvio Sá. Parte do repertório do Motor estreou em Abril deste ano com versões minimalistas d’A Troça Harmônica, fato que é motivo de orgulho e satisfação pra minha pessoa, e 2014 deve levar o restante das canções para o palco (uhuuu!) com parte do time que acompanhou o Golden nos períodos de gravação. Três palavras definem: mal posso esperar!




Tracklist:

01 - Elbow Pain
02 - La Edad del Futuro
03 - Birds Singing Lies
04 - Lucid Dream
05 - Sophie

Naturalmente, eu não poderia deixar de mencionar o fenômeno pop que é o duo Glue Trip. Quando do lançamento online da primeira faixa do que viria a ser o ‘Just Trippin’, seu EP de estreia, chamou-me a atenção a fina ironia dos títulos. Fazer do pé-da-letra uma ferramenta poética requer apropriação e domínio da linguagem, e fazê-lo num idioma estrangeiro é, no mínimo, ousado – as letras, em língua inglesa, só são possíveis porque se conjugam, a um tempo, os verbos rigor e despojamento. A viagem de cola começa com uma finíssima dor-de-cotovelo e, desde ela, fica muito latente uma força que atravessa o repertório inteiro. Para explicar o disco, Ernani Sá faz uma analogia com a observação de Abraão, que diz que, nos tempos de hoje, um publicitário tem apenas cinco segundos (justamente aqueles antes de pularmos o plim-plim pra ver qualquer vídeo no Youtube) pra prender a atenção de quem quer que seja. E seria justamente esta a tal força de ‘Just Trippin’: uma qualidade poderosíssima de refrão nas estruturas propostas nas melodias e nas harmonias. Não foi à-toa que a banda, antes mesmo de dar a nós conterrâneos o privilégio de vê-los em ação, foi estrear lá no SESC Pompéia; sua música cruza as distâncias como um raio, e caiu sobre mim de maneira arrasadora. Após vê-los no Indie Sessions, lá na Vila do Porto, me vi completamente contaminado. Corri para a internet e escrevi pra Lucas e Phil e não sosseguei até que ‘Elbow Pain’ virasse o toque do meu celular. E quantas vezes já não me vi cantarolando as melodias todas enquanto caminho nas ruas dos Bancários? Eu devo ainda destacar mais duas faixas: ‘La edad del futuro’, na qual Sergio Aires põe os ouvintes pra flutuar com sua flauta. Esta faixa, talvez pelo magnífico loop da primeira parte da melodia, é com certeza a representante mais forte da qualidade de refrão à qual me referia. E destaco ainda ‘Birds singing lies’ pela ousadia no uso dos samples de cantos de pássaros – a música popular se utilizando dos ruídos de maneira muito mais eficaz que a música erudita, vejam só. E tenho certeza que nenhum dos falsetes, reverbs, delays e elementos afins seriam possíveis ou prováveis sem a magia de Pepeu Gúzman, da Mardito Discos. A bela capa do EP, que foi lançado em etapas nas interwebs, também é assinada por Daniel Vincent. Glue Trip veio mostrar que não é preciso ranço ou receio ao se referir ao pop enquanto linguagem, e inaugura também uma bem-sucedida e brilhante estratégia de divulgação do seu trabalho. E que, às vezes, bastam apenas três ou quatro acordes.

É. Eu não sabia se conseguiria cometer esse texto a tempo de fazê-lo acontecer enquanto ainda temos um pé no ano ímpar, mas parece que consegui. E eu concluo dizendo que foram estes os sons que fizeram meu ano especial (música serve pra isso!) e, por isso, sou grato. Eu, que me ocupo de jogar umas quantas palavras ao vento, pretendo agradecê-los como posso. Fica registrado, neste parágrafo, a vontade de trabalhar com todos os mencionados que ainda não trabalhei – e de trabalhar mais ainda com quem já pude dividir um pouco do que ando fazendo! Aos que fazem girar a roda da boa música local eu quero e espero poder agregar. E em 2014, eu só posso desejar tudo de som. As esperanças são as melhores, e despontam no horizonte com o disco de Rinah Souto, previsto ainda para o primeiro semestre. Mas aí já são outros 365 dias e 6 horas... Avante!

Texto de Gustavo Limeira


Pra baixar, clique na capa dos discos.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Mauricio Kagel - Heterophonie; Improvisation Ajoutée [2002]


Mauricio Kagel era filho de judeus russos refugiados na Argentina, nasceu em Buenos Aires e com 26 anos mudou-se definitivamente para a Alemanha. Sua obra pode ser descrita como uma versão absurda e menos megalomaníaca da noção de Obra de Arte Total de Wagner. As partituras das suas obras contém não só instruções sobre a música a ser tocada, mas também a distribuição dos músicos no palco, falas, gestos, figurinos, interações físicas com outros músicos, mímicas e todo tipo de coisa não musical. Muitas vezes também existia um grande espaço para improvisação nas suas peças.

Esse álbum contém duas composições de Kagel, Heterophonie e Improvisation Ajoutée. Apesar de ter sido lançado em 2002, as gravações são muito mais antigas: a primeira foi gravada em 1967 e a última em 1966. Heterophonie é uma peça para orquestra em que várias linhas melódicas se sobrepõem aleatoriamente criando uma espécie de polifonia caótica que flutua em vários níveis de densidade sonora. Improvisation Ajoutée é uma peça de improviso para órgão, para um organista e dois assistentes que gritam, gemem e mexem nos botões que mudam os timbres do órgão.

Uma das pessoas que foram afetadas por essas gravações foi o jovem John Zorn, que quando tinha quinze anos comprou por 98 centavos um vinil da Improvisation Ajoutée e colocou pra tocar na casa de um amigo dele que gostava de Rolling Stones. Enquanto o amigo o olhava com terror e a mãe do amigo gritava mandando tirar o disco da vitrola, John Zorn pensava: "essa é a música!".

Abaixo, uma pequena amostra das obras mais teatrais de Kagel: uma partida de ping-pong para dois violoncelos (os jogadores) e um percussionista (o juiz):


Tracklist:

01 - Heterophonie I
02 - Heterophonie II
03 - Heterophonie III
04 - Heterophonie IV
05 - Heterophonie V
06 - Improvisation Ajoutée

Clique na capa do álbum pra baixar

domingo, 9 de dezembro de 2012

David Gould - "Adonai and I" e "Adonai in Dub" [2001]


David Gould é um baixista judeu nova-iorquino. Começou sua vida musical como quase todo adolescente que começa a tocar um instrumento: escutando rock. Mas os horizontes foram se ampliando: do rock descobriu o soul de Sly and the Family Stone, depois o jazz de Charles Mingus, a música de Fela Kuti e por aí foi. No meio dos anos 90, descobriu o reggae, e o abraçou plenamente (talvez por causa da conexão que existe entre o rastafarianismo e o judaísmo). Começou a pesquisar, tocar e compor reggae com uma dedicação quase religiosa, e em 2001 lançou seu primeiro disco, Adonai and I, versões roots reggae de orações judaicas. No mesmo ano, entrou em contato com John Zorn, o dono da gravadora Tzadik e possivelmente um dos judeus mais criativos dos Estados Unidos atualmente. Dentro da Tzadik existe uma coleção chamada Radical Jewish Culture em que Zorn desafia os artistas a criar algo de novo e relevante para a cultura judaica. E dentro dessa coleção, Gould lançou o disco Adonai in Dub, com versões dub do seu primeiro disco, produzidas pelo pianista Jamie Saft, outro grande nome dentro desse meio. O resultado são dois discos de reggae de altíssima qualidade - e você não precisa ser judeu pra escutar e gostar.





Tracklist de Adonai and I:

01 - Adonai Adonai
02 - Leha Dodi
03 - Veshamru
04 - Vihoo Vihoo
05 - Siman Tov
06 - L'Dor Vador
07 - Shalom Alechem
08 - Hiney Ma Tov
09 - Adon Olam (Minor)
10 - V'nemar
11 - Etz Chayim Hee




Tracklist de Adonai in Dub:

01 - Hinei Ma Tov Dub
02 - Etz Chayim Hee Dub
03 - Leha Dodi Dub
04 - L'Dor Vador Dub
05 - Siman Dub
06 - Adonai Noise Dub
07 - Sim Shalom Dub
08 - Adon Olam Dub
09 - V'nemar Dybbuk Dub
10 - Yigdal Dub

Clique na capa dos álbuns pra baixar.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Grupo Etnia - Canto Cereal [1992]


O Grupo Etnia foi um grupo que, entre 1986 e 1994 reuniu quatro músicos que moravam em João Pessoa: Alice Lumi, etnomusicóloga paulista descendente de japoneses, que toca uma profusão de instrumentos étnicos de sopro, cordas e percussão; Fernando Pintassilgo, graduado em flauta transversal na UFPB e especialista em instrumentos de sopro folclóricos; Paulo Ró, também conhecido pelo seu trabalho solo e com o Jaguaribe Carne; e Milton Dornellas, que há muito tempo desenvolve seu trabalho como intérprete e compositor em João Pessoa.

A idéia do Grupo Etnia era a de compor e interpretar músicas folclóricas e tradicionais de vários lugares do mundo. Há uma profusão de músicas andinas, com charangos e flautas tradicionais, além de samba, ciranda, música japonesa e até experimentações com música eletrônica e atonal. Apesar da disparidade de estilos, uma música céltica irlandesa é seguida de um caboclinho com naturalidade, dando ao disco uma sonoridade impressionantemente coesa. Além disso, o disco é de um grande interesse histórico, pelo simples fato de reunir quatro grandes personalidades da história da música paraibana recente.

Tracklist:

01 - Canto Cereal
02 - Will Ye Go To Flanders - Tae the Begin
03 - Caboclinhos
04 - Ciranda
05 - Huayno para la Luna
06 - Quarup
07 - Meu Canto tem Velas
08 - Kátems
09 - Deixa eu Tocar
10 - Piratas de Jaguaribe
11 - Pau-de-sebo

Clique na capa do álbum pra baixar.